Instituto Guaicuy

Justiça determina assessoria técnica para atingidos pela Jaguar Mining em Conceição do Pará 4d346z

10 de junho, 2025, por Laura de Las Casas 3t3w5g

No dia 28 de maio, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), por meio da desembargadora Yeda Athias, atendeu a um pedido do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) relativo às pessoas atingidas pela mineradora Jaguar Mining em Conceição do Pará, região centro-oeste de Minas Gerais. Segundo a decisão, a empresa deve promover, no prazo de quinze dias, a contratação de uma Assessoria Técnica Independente (ATI) para acompanhar o processo de reparação dos danos causados pelas atividades da empresa no território. 

A saga da população de Conceição do Pará começou no dia 7 de dezembro de 2024, quando centenas de pessoas foram deslocadas de suas casas, na comunidade de Casquilho de Cima, após o deslizamento de rejeitos sólidos da exploração do ouro da mineradora Jaguar Mining. De acordo com o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), uma onda de sedimentos atingiu parte da estrutura utilizada pela empresa na atividade de mineração, causando sérios danos socioambientais e obrigando moradores de 105 residências a deixarem suas casas. Na ocasião, um talude da pilha de disposição de estéril e rejeitos de mineração se rompeu, soterrando uma casa inteira e colocando as demais residências em risco.

As atividades da mineradora no local foram suspensas. Assim como o o à comunidade Casquilho de Cima, de onde moradores foram retirados e estão desde dezembro impedidos de rever seus pertences. 

Vidas atingidas  6h735v

A moradia atingida pelo talude da pilha de disposição de estéril e rejeitos era onde Lara Rafaela Morato vivia com seus pais e avós. Os treze quartos do casarão contavam com duas grandes varandas e um quintal onde galinhas, porcos e uma farta plantação compunham a vida tranquila da família. Na mesma rua, moravam tios e primos de Lara, compartilhando uma rotina tranquila e coletiva.

Na hora do deslizamento, ocorrido em dezembro, Maria Conceição, avó de Lara, estava fritando os bifes do almoço e teve quinze minutos para pegar as coisas mais importantes antes de deixar seu lar. A carteira com os documentos ficou para trás, assim como os R$ 22 mil juntados com a venda dos salgados que fazia para as pessoas de sua comunidade. Ela havia guardado o dinheiro em gavetas e armários, para futuros imprevistos e sonhos. “Os funcionários da mina chegaram e nos pediram para sair da casa, nos levaram para um hotel fazenda. Eu e meus avós fomos na hora, e meus pais pediram para ficar um pouco mais, para terminar o plantio, já que os funcionários disseram que o rejeito não chegaria na nossa casa. Poucas horas depois eles também foram retirados, e de noite nossa casa foi soterrada”, relembra a estudante.

A família foi encaminhada para um hotel fazenda, onde permaneceu por alguns dias até se mudar para uma casa alugada pela empresa, também em Conceição do Pará. Os vizinhos também foram deslocados para outras casas da região e de Pitangui, cidade próxima, e agora precisam se acostumar com suas vidas suspensas.

Após o incidente, a empresa divulgou uma nota explicando que o problema foi identificado durante uma inspeção e que havia tomado as providências oficiando os órgãos fiscalizadores e regulatórios. No dia 2 de fevereiro de 2025, entretanto, houve mais um deslizamento da estrutura, após intensas chuvas na região, reforçando ainda mais a necessidade de interdição da área onde está a comunidade. 

A mineradora ofereceu R$ 10 mil como “valor de urgência” para as famílias que tiveram que abandonar suas casas em dezembro. Os moradores seguem sem previsão de retornar para a área interditada e foram impedidos de voltar inclusive para buscar os pertences deixados para trás. 

Direito à Assessoria Técnica  42i31

O direito à Assessoria Técnica Independente está garantido pela Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (PNAB), sancionada no final de 2023 pelo presidente Lula. A política é uma grande conquista para pessoas atingidas por barragens — hidrelétricas, mineradoras, ou de outras naturezas — no Brasil que unifica os direitos de comunidades em todo o país ao definir o conceito de atingimento, estabelecer deveres para as empresas causadoras dos danos, apontar diretrizes para a reparação e estruturar ferramentas de participação popular em todo o processo.  O direito à participação livre, informada e prévia, o direito à Assessoria Técnica Independente (ATI) e o direito à negociação coletiva dos termos da reparação integral são garantidos dentro desta política. 

Saiba mais sobre a PNAB aqui. 

Seguindo estas diretrizes, em 21 de janeiro deste ano a Justiça já havia determinado que a Jaguar Mining financiasse a contratação de uma ATI para acompanhar as pessoas prejudicadas pelas atividades da empresa em Conceição do Pará. A ordem surgiu após um pedido do MPMG, que entendeu a necessidade de auxílio técnico à comunidade para garantir a participação no processo de apropriação dos próprios direitos diante das ações da empresa na região.

A decisão, no entanto, foi suspensa no dia 4 de fevereiro após a empresa argumentar que faltava a definição por parte do MPMG de prazo, valor e escopo do trabalho da assessoria técnica. Após o cumprimento dessa questão, a desembargadora determinou, na última semana, a escolha imediata de uma instituição escolhida pela comunidade para executar o escopo de trabalho da ATI. Ele contempla, necessariamente, a elaboração do cadastro das pessoas atingidas e a matriz dos danos sofridos após o deslocamento das pessoas de suas casas. Ainda cabe recurso por parte da mineradora.

Na última semana, o MPMG publicou um edital de chamamento público para a contratação da ATI e determinou que o Plano de Trabalho das instituições candidatas deve ser entregue até 17 de junho. De acordo com o comunicado divulgado pelo órgão, a ATI escolhida pela comunidade atuará junto às 118 famílias atingidas pelo deslizamento da mina Sá Tinoco (Jaguar Mining), totalizando 288 pessoas já cadastradas. É necessário garantir o atendimento de todas as pessoas atingidas, mesmo aquelas ainda não identificadas.

Segundo o MPMG, o plano deve incluir o cadastro e levantamento de danos individuais e coletivos, matriz de danos com valoração, cadernos familiares e apoio à participação informada da comunidade em todo o processo de reparação. O prazo máximo de execução é de seis meses, com orçamento limite de R$ 3.303.288,65.

As assembleias de votação ocorrerão nos dias 17 e 18 de junho. No dia 17 será feita a apresentação pública das ATIs (20 minutos por entidade). No dia 18, as entidades responderão às perguntas da comunidade (10 minutos) e ocorrerá a votação pública.

Guaicuy visitou Conceição do Pará 1o274r

O Guaicuy é uma das entidades que se candidatou e foi credenciada para assessorar a comunidade. O Instituto já realiza este trabalho em algumas cidades atingidas pela Vale na Bacia do Paraopeba e na Região da Represa de Três Marias e na comunidade de Antônio Pereira, distrito de Ouro Preto. Carla Wstane, diretora do Guaicuy, já visitou Conceição do Pará algumas vezes para entender o contexto da comunidade e avaliou a urgência de se garantir o o à informação das pessoas que foram deslocadas.

Para ela, a comunidade de Conceição do Pará tem pela frente uma grande luta pela garantia dos direitos que foram violados com esse episódio da mineradora. “A assessoria técnica independente tem como papel acompanhar o processo de reparação e fornecer informações às pessoas envolvidas para que elas tenham a chance de entender tanto as dimensões dos danos sofridos quanto o processo judicial necessário para reparar esses danos. Isso é feito por meio de uma equipe multidisciplinar, que se ampara em análises técnicas capazes de oferecer aos envolvidos a compreensão ampla da situação e as possibilidades de ação diante da violência que sofreram”, explica.

A diretora acredita que o Guaicuy pode oferecer um e consistente à comunidade, neste processo, baseado na experiência de mais de cinco anos de atuação como ATI em diferentes territórios de Minas Gerais. “Nesse tempo, junto aos mais de dez municípios que acompanhamos no processo de reparação de danos causados pela mineração, desenvolvemos cadastros e levantamentos de danos individuais e coletivos, construímos matrizes de danos com a valoração deles e mantemos um constante trabalho de garantia da participação informada dessas pessoas na difícil caminhada rumo à garantia de seus direitos. Tudo isso só é possível a partir da criação de vínculo e confiança, que por sua vez são construídos com dedicação e tempo”, analisa. De acordo com Carla, o Instituto foi credenciado para concorrer como ATI das pessoas atingidas em Conceição do Pará para que, com sua equipe qualificada, consiga apresentar uma proposta de atuação que contemple os desejos e a escuta ativa de quem foi afetado pela mineradora. 

*Crédito da imagem: Filipe Lacerda 

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